sexta-feira, 22 de junho de 2018

Capítulo 6 - Pelada Defronte ao Cubano

A gente fica maluca em Miami com tamanha quantidade de outlets que transformam pessoas em compradores compulsivos. Também há uma enormidade de lugares para se divertir, inclua nesse pacote os restaurantes com seus cardápios deliciosos. No entanto tive que pegar leve e adiar compras e gastos desnecessários, pois o foco naquele momento era arrumar um trabalho para não queimar todo o meu pequeno patrimônio. Tá legal, eu sei que fiquei com os dólares do Matheus, porém a grana estava no Brasil e eu não tinha como pegar, a menos que voltasse para Campinas. Ademais, eu tinha um pressentimento de que o mais sensato seria deixar aquele dinheiro no gelo por um bom tempo antes de começar a gastá-lo.
Trouxe o suficiente para o básico. Os passeios a lugares turísticos e interessantes seriam feitos futuramente conforme tivesse oportunidade. O próximo passo era conseguir uma fonte de renda para que minha estadia de alguns meses não fosse apenas de subsistência, queria ter diversão também.
Meu Visa tinha validade de seis meses, mas, por ser de turista, eu não poderia trabalhar oficialmente. Então novamente eu quebraria algumas regras trabalhando em algo extraoficial; só não havia decidido em que. Ainda era minúscula a minha rede de contatos e também precisava adquirir um pouco mais de conhecimento sobre a cultura local. Passei o domingo e boa parte daquela segunda-feira buscando informações no facebook, em grupos de brasileiros na Flórida.
Naquela noite fui para mais um treino de Muay Thai. Meu mestre, o Héctor, falou comigo reservadamente durante a aula e disse que tinha um presente para mim, mas eu só veria na hora de ir embora, pois estava em seu carro. Sacanagem, fiquei morrendo de curiosidade.

Ao final da sessão de porradas, quando eu e o Héctor deixamos o interior da academia, apenas um cara que era responsável por desligar tudo e fechar o local ainda permanecia no interior do edifício. Caminhamos em direção ao seu carro que estava estacionado defronte ao prédio. Após abrir o porta malas ele presenteou-me com uma TV Led de 32 polegadas, usada, segundo ele, porém com aparência de nova, inclusive ainda estava na caixa. Fiquei feliz demais, pois minha casa parecia um cemitério, devido a falta de um televisor ou aparelho de som. Eu dei um selinho no homem em forma de agradecimento. Foi bem na hora que a noia apareceu do nada. Aquela mesma do dia chuvoso sob a marquise do supermercado. Ela surgiu tipo uma assombração e chegou apavorando. Estava toda valente desta vez. Deve ter trocado o crack por ecstasy, falei comigo mesma.
— Então pra essa você dá TV nova, carona e deve dar dinheiro também. Mas para seu filho você não dá nada.
Que merda! Esta garota novamente. E que filho é esse? Pensei. E começou uma discussão entre os dois, afastei-me alguns passos enquanto ofensas eram trocadas. O nível de fúria chegou ao ponto do hondurenho segurar a garota pelo pescoço e vociferar que calaria a boca dela para sempre. Comecei a temer pela vida daquela barraqueira, pois a infeliz começou a se debater por não estar conseguindo respirar. Eu intervi pedindo para que a soltasse e não fizesse algo do que pudesse se arrepender. Honestamente… eu não estava com dó, mas se acontecesse o pior com aquela sem noção, o Héctor estaria fodido.
Ele teve um momento de lucidez e largou a maluca. Ela chorava e mal conseguia falar de tanto que tossia, enfim ela abaixou a crista. Puto da vida ele tirou alguns dólares da carteira e jogou em direção a ela proferindo palavrões. Após fechar o porta malas com raiva, pediu que eu entrasse no carro e saímos fora. Ainda vi a garota pegando o dinheiro do chão e ficou nos olhando enquanto o carro se afastava.
No caminho ele falou que a garota tinha um filho de um ano de idade e ela jurava ser filho dele. O homem falou que duvidava, pois na época em que eles estavam juntos, houve um barraco forte na casa onde ela morava com a irmã mais velha e o cunhado. A irmã flagrou a piriguete transando com seu marido na cama do casal. Depois ela revelou que o cunhado pagava para transar com ela e faziam isso há meses. A irmã a mandou embora de sua casa, e o Héctor também terminou com ela.
— Mas vocês não usavam preservativo durante as relações?
Ele respondeu que sim, mas aconteceu uma ou duas vezes de eles praticarem o coito interrompido. Porém ele afirmava ter certeza de não a ter engravidado. Depois do ocorrido ela começou a ir para a cama com qualquer um e por qualquer quantia.
— Mesmo não assumindo a paternidade, de vez em quando eu dou algum dinheiro pra ela, mas é por dó da criança — concluiu ele.
Estávamos chegando em casa e eu não queria ser vista com ele. Isto acabaria queimando meu filme com o meu senhorio cubano que não ia com a cara do meu amigo. Pedi que parasse na esquina mais próxima e falei com muito jeitinho para ele não parar mais defronte ao meu prédio. Ninguém tinha nada a ver com a minha vida, no entanto queria evitar comentários desagradáveis. Meu amigo disse entender a minha situação, e faria isso por mim. Ele sabia que o motivo era o meu senhorio cubano. Foi gentil em não dizer nada. Agradeci mais uma vez e ele se foi. Eu sofri para levar aquele negócio até em casa, não era pesado, mas era grande e desajeitado para carregar.
Como sempre, em meus retornos ao lar, encontrei seu Ramon assim que adentrei o condomínio. Eu já estava ficando neurótica com sua marcação cerrada. Pelo menos ele ofereceu-se para levar a caixa e eu aproveitei a oportunidade e pedi para ele instalar o aparelho pra mim. Ele deixou a caixa em minha porta e foi pegar as ferramentas necessárias em seu apartamento. Aproveitei para tirar a camiseta, tênis e lavar mãos e rosto, a noite estava quente e eu morrendo de calor pelo esforço feito.
Após seu retorno, respondi sua pergunta se eu tinha comprado ou ganhado.
— Comprei no Best Buy, aproveitei a promoção por ser uma peça do mostruário.
— E você desistiu de comprar o computador, niña?
Ele havia me perguntado outro dia se eu não sentia falta de um televisor. Eu respondi que sim, mas no momento eu compraria um computador, a TV esperaria para quando eu conseguisse um trabalho.
Respondi sua segunda pergunta dizendo que precisava do computador, mas adiaria a compra, pois o dinheiro estava curto. Pelo menos poderia navegar pela internet na tela grande do televisor, pois o aparelho é Smart TV. Ainda tive que dar mais detalhes sobre a compra, todos inventados, claro, inclusive o táxi fretado para trazer o bagulho.
Recebi também um elogio referente ao top e o short coladinho que estava vestindo. Eu uso na academia de luta, mas para todos os efeitos eu frequento uma academia de fitness distante dali. Visto uma camiseta por cima da roupinha para fazer o caminho de ida e volta para casa.
Ele também achou que a TV parecia nova e sem uso, apesar da bagunça no interior da caixa com cabos  e peças fora das embalagens. Melhor que seja nova eu pensei, só não o deixaria saber que era um presente do hondurenho.
Fiquei observando o homem enquanto ele fixava o aparelho em uma parede onde outrora houvera outro televisor. Ele lembrava o meu avô, os dois tinham o mesmo jeitão autoritário de militar, porém o cubano tinha uns vinte anos a menos e os cabelos levemente grisalhos. A pele branca queimada de sol, boa altura, braços fortes. Apenas a barriguinha é que começava a ficar insinuante.
— O Sr. é policial, seu Ramon?
Ele olhou pra mim com um semblante fechado e apreensivo. Arrependida de ter feito a pergunta, eu já emendei com um argumento.
— É que o senhor parece muito com meu avô, digo, no jeito e modo de falar. O meu avô é coronel aposentado da polícia militar do Brasil.
Ele respondeu meio a contragosto, disse que trabalhou no governo cubano, mas não era policial.
Mudei de assunto rapidão; falei que estava procurando um trabalho e, caso ele soubesse de alguma coisa, eu agradeceria a ajuda. O papo ficou mais descontraído com o decorrer dos minutos. Ele quis saber se o Carlos era o meu namorado, respondi que não, era um colega e a gente se curtia e ficava. Precisei explicar o significado de curtir e ficar.
Ele terminou o serviço, ligou a bicha e estava tudo funcionando. Falei que não oferecia uma bebida para ele porque eu não tinha nada em casa, não consegui comprar. O homem recolheu suas ferramentas e perguntou qual tipo de bebida me agradava. Para fazer média falei que adorava os coquetéis cubanos, daiquiri e mojito principalmente — e amo mesmo esse tipo de bebida —. Qualquer dia desses ele me ensinaria a fazer o verdadeiro mojito havano, falou animado. Fiquei decepcionada, deduzi que ele pegaria a bebida em sua casa naquele instante e não um dia qualquer, mesmo assim agradeci e quis lhe dar uma caixinha pelo serviço. Ele gentilmente recusou e disse estar à disposição para quando eu precisasse de manutenção em algo da casa.
Fui para o banho após ele sair. Meu corpo estava dolorido pelo esforço feito na aula de luta e precisava de uma ducha gostosa e uma massagem com um óleo de camomila para aliviar as dores.
Sentei em minha cama após o banho, liguei a TV em um canal qualquer e comecei a massagear meu corpo nu com o óleo relaxante. Assustei com três batidinhas em minha porta, olhei o relógio e passava bastante das 22h. Cheguei pertinho e perguntei quem era.
— Soy yo, Ramon, Kamila.
Pedi para ele esperar um minuto, corri até o mini closet e peguei um robe levinho só para cobrir rapidamente o meu corpo. Atendi a porta receosa da intenção da visita do homem àquela hora da noite. Abri só uma fresta, fiquei com o corpo colado na parte de dentro da porta, pois a seda fina mostrando minhas curvas poderia despertar alguma tara naquele senhor. Coloquei a cabeça no vão e o vi com um copão na mão com folhinhas verdes no interior, limão socado, uma bebida cristalina e gelo.
— Fiz um mojito havano para ti, ninã. — ofereceu-me o copo.
Quase gritei de tanta felicidade, estava doida por uma bebida. Abri a porta rapidão e… soltei um gritinho. A porra da maçaneta entrou na fresta do meu robe e o levou junto quando escancarei a porta. Fiquei pelada na frente do homem com meu robe todo aberto. Virei rápido de costas para ele.
— Jesus! Me desculpe, seu Ramon — falei assustada e toda sem graça.
— Tranquila, Kamila, foi demasiado rápido — falou o danado demonstrando a decepção de quem não viu o suficiente.
— Pero no mucho, né? — falei zoando e rimos do meu mico.
Peguei o copo e agradeci dizendo que ele adivinhou meu pensamento, pois agora mais que nunca eu precisava de uma bebida. Novos sorrisos e desejos de boa noite e bons sonhos, desculpei-me novamente pelo incidente e fechei a porta.

Seu Ramon bateu em minha porta na manhã seguinte. Trazia consigo um Computador Desktop completo. Disse que era de um ex morador que saiu devendo e pagou como pode e com o que tinha na residência. Ele comentou não ter intimidade com estas tecnologias e também ninguém se interessara em comprar o aparelho. Ele me deu de presente. Claro que recusei à princípio, pois achei que ele estava muito cheio de gentilezas desde a noite anterior quando trouxe a bebida. E depois de ter me visto pelada, acho que ficou animadinho demais. Porém acabei aceitando o presente, ele foi tão insistente que seria desfeita da minha parte recusar o negócio.

Continua…

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