quinta-feira, 28 de junho de 2018

Capítulo 12 - Uma Entrevista Singular

Terminei meu namoro com o Héctor no sábado, um dia depois em que fui testemunha ocular daquela putaria no escritório da academia. Tomei vergonha na cara e saí fora daquele hondurenho depois de um papo reto na mesma sala do ocorrido. Falei que o vi transando com a biscate. Cinicamente ele negou dizendo que eu estava louca.
— Você está querendo o que? — uma reconstituição de cena para refrescar sua memória?
Descrevi com detalhes e escárnio a nojeira que presenciei entre ele e aquela noia. Ele teve a cara de pau de dizer que foi uma armadilha e que a garota o havia dopado. Quase soquei a cara do cretino por considerar-me tão idiota assim. A nossa conversa foi definitiva para mim, mas não foi definitiva para ele, o homem continuou cercando o meu caminho em minhas idas e vindas do trabalho durante aquela semana.

A Luana me dispensou no sábado seguinte, oito dias depois que terminei com o Héctor. Estava livre, leve e solta, sem namorado e sem emprego.
Aliás, eu fiquei desconfiada que ele tivesse algo a ver com a minha demissão, já que mora no mesmo bairro da Luana. O machão não suporta ser contrariado e é vingativo. Mas pensei melhor, ele teria que ser muito infantil e babaca para chegar a esse ponto, provavelmente era só neurose minha, descartei a hipótese.

Voltando ao sábado da demissão e do comunicado da Luana: ao final do nosso expediente ela iniciou uma conversa dizendo que daria a vaga para a mulher que trabalhava com ela antes de mim, pois a senhora estava precisando mais do que eu. Falei que entendia, agradeci por ter me ensinado a limpar casas à moda americana e também pela experiência adquirida. Ela pagou a minha semana de trabalho e deixou-me no ponto de ônibus como de costume.
Eu estava mesmo querendo deixar aquele trabalho, porém não tão rápido assim, fui pega de surpresa, mas não achei ruim, pois decididamente aquilo não era pra mim. Praticamente não tinha mais vida social e o dinheiro era pouco. Até que foi legal conhecer com detalhes aquele tipo de limpeza, contudo, basta uma vez apenas, "inclua-me fora disso" no futuro. Era puxado limpar aquelas residências enormes caprichando em cada detalhe, porém fazendo tudo super rápido para que a meta diária fosse cumprida. Jesus amado, terminava o dia esgotada e cheirando a cloro, lavanda, pinho ou flores silvestres. A propósito, a fragrância deste último era uma delícia, todavia em banheiros e demais ambientes, mas não em meu corpo.
Mas nem era esse o motivo principal da minha insatisfação com o serviço, na real, além da falta de tempo para o lazer, eu também estava sentindo-me explorada recebendo apenas vinte dólares por cada residência. Eu sabia que outras "helpers" (ajudantes de uma pessoa contratada) ganhavam trinta dólares por casa, ou mais caso o imóvel fosse grande. A Luana não estava sendo justa comigo. Eu sairia sem revelar o verdadeiro motivo para não criar inimizades; assim manteria a porta aberta para quando necessitasse.
Eu também não estava disposta a trabalhar de sol a sol e dia após dia só com a intenção de juntar dinheiro. Queria ter uma vida social com diversão e lazer naquele momento, ou seja, viver o agora enquanto ainda era jovem, saudável e cheia de energia. Continuo com o mesmo modo de pensar: o futuro é algo tão distante e incerto que deixo minha atenção voltada ao presente sempre que possível e vivendo um dia de cada vez.

No domingo eu mandei uma mensagem para a Jasmim (minha amiga do ponto de ônibus), perguntei se eu teria alguma chance de conseguir uma vaga no restaurante em que ela trabalhava. Sua resposta foi que sim, eu a encontraria na manhã do dia seguinte (como de costume) e a acompanharia para poder analisar in loco, só depois eu conversaria com o gerente para tentar uma vaga. Ela supunha que daria certo, pois estavam contratando e era adequado à minha situação, já que era um serviço alternativo (um bico). Meu visto de turista não me permitia ter um trabalho regular, assim como ela que até já estava com o visto vencido, era uma indocumentada, é assim que nomeiam os que estão com o Visa vencido ou "Overstay" como diriam os americanos.
Conforme havíamos combinado eu fui com ela para falar com o gerente e tentar a sorte. A amiga apresentou-me ao hispânico cinquentão e o homem de imediato fez cara de contrariado, disse que não poderia contratar ninguém com menos de 21 anos. Eu disse que já tinha 21, mas ele duvidou, porém foi simpático comparando minha aparência com a de sua filha de 15 anos. A seguir pediu o meu documento para verificação. Após confirmar a minha idade, a expressão em seu rosto mudou da água para o vinho, aparentando felicidade e cheio de simpatias, pediu para acompanhá-lo até uma saleta, seu escritório, eu seria entrevistada. Na verdade ele analisou o meu corpo e movimentos pedindo para eu desfilar de um lado para o outro com graça e sorrisos. Explicou sobre a necessidade de sempre atender bem os clientes, era a chave do negócio. Depois quis saber se eu era casada, ou se tinha parentes nos EUA. Eu já li e ouvi inúmeras recomendações para que mulheres nunca revelem que estão sozinhas, seja em qual país for, é muito perigoso. Eu falei que vim para os Estados Unidos para morar com meus dois irmãos que residem em New Jersey e até fiquei por lá duas semanas, porém decidi acompanhar meu namorado (também brasileiro) que veio para Miami, ele conseguiu um trabalho em uma construtora da cidade. Eu também consegui um trabalho e resolvi ficar por aqui. Ele quis saber qual era o meu trabalho, falei que era de diarista, limpando casas. Acrescentei dizendo que eu já tinha experiência no atendimento ao público, no Brasil eu trabalhava nos stands de feiras e eventos .

Aparentemente eu cumpri todas as etapas e seria contratada, porém… Ele perguntou sobre o meu nível de inglês, pois a exigência era de que falasse e entendesse um pouco. Eu conseguia conversar em espanhol com facilidade, mas o meu entendimento do inglês era muito pobre, apesar de eu estar ralando nos estudos online e ouvindo podcasts a cada minuto livre.
Não rolou o trampo de garçonete, fiquei triste, posto que a colega havia comentado sobre os clientes generosos e as caixinhas ótimas. O salário era o mínimo, mas somado às gorjetas ela recebia o triplo do salário fixo. Mas nem tudo estava perdido, o cubano disse que precisava de alguém imediatamente para cuidar da limpeza e se eu me interessasse o emprego seria meu. "Oh meu Deus! Faxina de novo?" Pensei com desânimo enquanto ouvia mais outros detalhes sobre a vaga. Caso aceitasse, esta vítima aqui também ajudaria na higienização da cozinha, ou seja, iria lavar louça e limpar o chão.
No entanto as esperanças se renovaram quando ele comentou sobre as sextas e sábados, era quando a casa ficava abarrotada de clientes por causa da música ao vivo durante o happy hour e o clima de balada dos finais de semana. A clientela, composta quase 100 % de rapazes e senhores que trabalhavam nos arredores, ou eram hóspedes de hotéis próximos que estavam de passagem pelo país por motivos profissionais ou lazer. Eles costumavam ficar até de madrugada no estabelecimento, uma vez que teriam o sábado e domingo livres. Eu poderia trabalhar de atendente de restaurante nestes dias e teria a ajuda das outras meninas com o inglês, caso fosse necessário. Seria um teste e se me saísse bem, seria promovida a atendente. Maravilha, fui contratada e trabalharia Full Time (período integral).
Perguntei quando começaria. A resposta foi breve:
— AHORA. — E ganhei um uniforme… Dois números acima do meu manequim, e também um carrinho que era um kit de limpeza. Felizmente também ganhei um par de luvas. Minhas mãos e unhas agradeceram.
Ali o pessoal não fica enrolando, trabalha mesmo. Fui logo para o dia de trampo começando pelos banheiros. Argh! Sem problemas, levaria na boa. Quem olha para o meu jeito delicado, aparentemente frágil e toda cheirosinha, deve pensar que sou uma patricinha. Não se enganem, sou uma batalhadora e adapto-me às situações extremas com mais facilidade do que muitos durões ou "mulheres sargento" — mulheres fortes, robustas de aparência bruta.
No período da tarde fui ajudar na cozinha, e toma-lhe mais limpeza: chão, fogão e queimei meus dedinhos ao tirar aquela bagulhada fumegando da lavadora de louça. Ainda sobrava pra mim o trabalho de colocar o lixo para fora. Vai pensando que vida de empregada mais nova é mole, é punk mano. No final do dia estava só o pó, e o salário era o mínimo. Pelo menos o almoço era bom e grátis.
O restaurante era longe do centrão e de lugares onde fervilhavam as casas noturnas tipo a Washington Avenue, ficava ao lado do cruzamento da Dolphin Expressway com a Le Jeune Road, próximo ao aeroporto, mas do lado oposto ao do hotel em que fiquei ao chegar nos EUA. O lugar parecia um bairro de periferia onde o comércio se concentrava na avenida principal. Um supermercado, posto de gasolina, lanchonetes, restaurantes e um hotel grande de uma rede famosa e outros dois mais simples e sem fama. Os hóspedes dos hotéis e trabalhadores do entorno eram os que movimentavam o restaurante na hora do almoço e também no happy hour de todas as tardes e noites. Durante a noite não havia jantar, as opções eram lanches ou uma variedade de porções bem boladas com frutos do mar e drinks deliciosos. “Mas será que é só isso que atrai tanto esses consumidores do sexo masculino?”, questionei-me.

Continua…

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