quarta-feira, 11 de julho de 2018

Capítulo 25 - Noite Sangrenta

No dia seguinte quem chegou de surpresa ao cubículo das transas foi o nosso colega segurança, agiu rápido dando uma coronhada violenta na cabeça do vigia o deixando fora de combate. Arrastou o corpo para debaixo da minha cama. Temi que o salvadorenho estivesse morto depois das ameaças feitas pelos outros caras no dia anterior. Bateram muito nele, havia marcas feias de agressão em seu rosto. Minha esperança de fuga se renovara.
—  Vou tirar vocês daqui agora ou terão poucas horas de vida — falou aflito.
O nosso aliado ficou sabendo que pessoas da seita do cubano nos levariam para um ritual satânico e a nossa participação seria como oferendas… seríamos as sacrificadas. Precisei apoiar a Jasmim para ela não cair quando suas pernas bambearam. O colega deu a cada uma de nós uma camiseta enorme e masculina do Miami Heat (time de basquete), desculpou-se por não ter conseguido roupas apropriadas, não havia mais tempo. Ficou até legal, parecia um vestido folgadinho e foi providencial, uma vez que duas garotas completamente nuas chamariam muito a atenção dificultando ainda mais a nossa fuga. Ele pediu para ficarmos em silêncio e ficou olhando para seu relógio. Quase tive um enfarte quando ouvi uma explosão e começou uma gritaria dentro do bordel.
— Vamos agora! — ele disse.
Saímos ao seu sinal nos esgueirando com cautela pelo corredor em sentido contrário ao da saída. O clima ficou tenso e agitado ao extremo, gritos diziam que a "Mara Salvatrucha" a gangue rival, viera para um acerto de contas. O apaixonado pela minha amiga falou rápido e resumidamente: procurou o hondurenho, falou sobre nós e pediu sua ajuda. Seus parceiros causaram a explosão do lado de fora e neste momento ele (o Héctor) deveria estar no interior do edifício, revelou o cara. Duas outras explosões aconteceram em sequência, ao seu comando nós corremos para os fundos e descemos dois lances de uma escada. Fiquei tomada de emoção e felicidade quando vi o Héctor degraus abaixo de nós, meu desejo era abraçá-lo e enchê-lo de beijos, apesar das duas armas empunhadas por ele. Mas não havia tempo para cumprimentos, beijos ou abraços. Descemos correndo para fugirmos pela saída secreta existente na primeira sala, logo ao pé da escada (segundo o salvadorenho). Não teríamos chance de sair pela entrada, os inimigos em peso estariam lá buscando os responsáveis pelas explosões.
Chegando na tal sala os homens arrastaram uma geladeira posicionada ao fundo, seguraram e puxaram para o lado uma parede móvel, ela escondia a entrada de um túnel usado no transporte de material ilícito e também pessoas. A alegria momentânea transformou-se em pesadelo quando o salvadorenho disse transtornado:
— Não é possível, não existia esta grade aqui.
Barras de aço com uma fechadura trancavam a entrada do túnel. O clima de tensão piorou ao ouvirmos passos de alguém descendo correndo as escadas. Fiquei tão assustada quanto o recém chegado quando nos viu e de imediato apontou sua arma e atirou em nossa direção. Os homens em nossa companhia atiraram de volta… o intruso caiu… o salvadorenho também. Um tiro acertou em cheio o seu peito e ele desabou. Um silêncio mortal durou por alguns segundos, até que o hondurenho abaixou para verificar as funções vitais do nosso aliado. Ele balançou a cabeça negativamente dizendo que o colega estava morto. A amiga teve uma crise de choro, eu a abracei, ao mesmo tempo dei atenção ao homem nos alertando sobre os tiros terem alertado os outros, logo teríamos companhia e era preciso estarmos preparados.
O Héctor deitou a geladeira e defronte dela uma mesa, era como se construísse uma barricada para proteger-nos, ele temia por um tiroteio. Pediu para ficarmos em silêncio absoluto e irmos para detrás da proteção ao seu sinal. Caminhou até o pé da escada, verificou se o bandido estava morto, pegou a arma do cara e depois o arrastou para um canto o escondendo. A seguir ele quebrou as lâmpadas de uma luminária do teto próximo da escada e juntou os cacos logo abaixo ao primeiro degrau. Eu ia perguntar para que serviria aquilo, mas ele pediu silêncio. Claro, aquilo não era para cortar os pés dos caras e fazê-los sangrar até a morte, né? Pensei.
O estrategista fez sinal para irmos para detrás da barricada, apagou a luz da sala e ficou posicionado fora dela, apagou a última luz e ficamos na penumbra. Um minuto depois ouvimos passos apressados de pessoas descendo as escadas, comecei uma oração, porém o meu repertório era minúsculo e depois da ave Maria eu não sabia mais para que santo rezar. Fez-se silêncio por um tempo angustiante, só então ouvimos sussurros de homens falando algo incompreensível, mas era nítido que desciam as escadas em nossa direção e estariam com dificuldades por causa da escuridão e também cautela para não serem surpreendidos… Ouvi um som característico de vidro sendo moído e a seguir vários disparos de arma de fogo. Quase gritei ao ouvir os tiros bem próximos, contudo deduzi terem sidos disparados pelo hondurenho. Aguardamos outros segundos torturantes de silêncio até a luz clarear o local e ouvir a voz do Héctor dizendo ter acertado e derrubado os caras. Eu e a Jasmim levantamos cheias de medo. O hondurenho disse que era a chance de sairmos dali e tentarmos uma outra rota de fuga.
De repente ouvimos um tiro similar ao estrondo de um canhão. Fiquei desesperada ao ver um fio de sangue saindo da cabeça do Héctor e ele desabando de costas no chão. O homem ficou inerte. Eu e a amiga não seguramos um grito de pavor e voltamos para detrás da proteção; não adiantaria de nada, nós sabíamos, já que não estávamos armadas e seríamos presas fáceis para aqueles animais. Eu pensei na punição imposta por nossa tentativa de fuga, pagaríamos com a vida e seria de imediato.

Dois caras conversavam e um deles gritou para sairmos com as mãos para cima, ou eles iriam entrar atirando. Eu olhei assustada e cheia de dúvidas para a amiga, pois achei que eles atirariam assim que vissem a gente. Ela estava em prantos e balançava a cabeça negativamente, não queria sair. O cara disse que contaria até 5 e se não saíssemos eles nos encheriam de chumbo: 1… 2… 3… 4…
— POLÍCIA DE MIAMI, LARGUEM AS ARMAS! — foi a ordem dada por alguém mais acima nas escadas.
Na sequência ouvimos os palavrões pronunciados pelos pistoleiros e vários tiros de ambos os lados. Quando cessaram os disparos só ouvíamos o choro da Jasmim, os meus soluços e as batidas fortes e aceleradas do meu coração. Uma voz ordenou:
— Saiam agora e mostrem as mãos! — Eu conhecia aquela voz, era do Carlos.
Eu gritei dizendo para não atirarem, eu sairia com a minha amiga. Levantamos receosas olhando para tudo, só tinha o corpo do Héctor caído e sem vida, meu coração ficou apertadíssimo e não segurei uma crise de choro.
Com a presença do Carlos e o Xavier, acreditei que finalmente aquele pesadelo chegaria ao fim. Os policiais perguntaram se havia mais alguém conosco, respondi negativamente. Tremendo e arrasada me aproximei do Héctor. Abaixei para acariciar o seu rosto, ele suspirou levemente ao toque da minha mão e abriu os olhos.
— ELE ESTÁ VIVO! — gritei com toda a minha alegria.
Ele tentou se levantar.
— Fica deitado aí seu doido, você levou um tiro na cabeça!
— Pegou de raspão — ele falou como se fosse algo normal.
Sentei no chão e o puxei para cima de mim deitando sua cabeça em minhas pernas. O acariciei e chamei de louco suicida.
— Se você fizer isso de novo eu te mato — falei sem saber o que dizia, de tão feliz que estava.
O Carlos se aproximou de arma em punho, enquanto o Xavier recolhia as armas dos caras caídos e verificava se os bandidos estavam realmente mortos. Falei sobre o ferido em meu colo, ele não era um dos bandidos, foi baleado enquanto tentava nos libertar e defendia a gente. O Carlos disse ter conhecimento, fora ele, o hondurenho, quem fornecera as informações sobre as atividades do local e também da situação punk em que eu me encontrava junto com a Jasmin.
Com dificuldade o Héctor tentou se levantar, ele parecia grogue. Eu o ajudei, passando o braço em sua cintura e ele se apoiou em meu ombro. O policial verificou o ferimento, não era grave.
— Você teve muita sorte de não ter sido uns milímetros mais para dentro ou teria sido fatal. Só sentirá dor de cabeça por alguns dias — explicou o Carlos.
Enquanto os policiais davam uma verificada rápida no local, eu dei um beijo no hondurenho e agradeci por não ter desistido de mim. O homem da SWAT disse que não era hora para isso, tínhamos que permanecer alertas e sairmos com cuidado, pois poderia haver mais bandidos escondidos no prédio.
O Héctor perguntou para os policiais o que aconteceria a seguir. A resposta do Xavier foi assustadora.
— Todos prestarão depoimento no distrito.
— Vocês sabem que eu irei direto para o presídio se for ao distrito — ele disse aos homens da lei.

Continua…

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