quarta-feira, 4 de julho de 2018

Capítulo 18 - Noite Tenebrosa

O Carlos não voltou naquela noite de domingo, ficou de plantão. O almoço que o Xavier comprou acabou virando jantar. Batemos um bom papo durante e após nossa refeição, tivemos a oportunidade de nos conhecermos melhor. A conversa rolou tão descontraída que o tempo voou. Era hora de dormir, ele acordaria cedo na manhã seguinte para ir trabalhar e eu aproveitaria a carona do amigo.
Arriei meu corpo cansado sobre a cama do Carlos, mais algumas horas de sono me fariam bem. A sensação de segurança por saber que o Xavier estaria ali tão pertinho era agradável demais.
Porém meu sono foi agitado mais uma vez, tive um pesadelo terrível. A impressão era a de estar em um tipo de porão pertencente ao condomínio em que morava até horas atrás, mas a aparência era a de uma caverna. Estava deitada nua sobre uma mesa de pedra rústica e fria. Apesar de sentir a presença de inúmeras pessoas, conseguia enxergar apenas um ser em pé à minha frente. Seu tronco era algo sinistro, igual ao bode do cubano, com a mesma cabeça de expressão maligna e chifres curvados. Pareceu-me real e não apenas um capuz a cabeça animal daquele ser estranho. Tinha também peitos femininos, volumosos e naturais e, para completar, seus membros inferiores eram similares aos de um Minotauro. Ainda assim eu sabia que aquele ser mitológico de uns 2 metros de altura era o seu Ramon. O pavor tomou conta de mim quando ele disse algo em um dialeto estranho com uma entonação demoníaca. Compreendi que ali acontecia um ritual e eu seria violentada pela fera e sacrificada a seguir. Aquela coisa exibiu seu pênis tão monstruoso e disforme quanto o seu corpo, e deu a entender que cobraria o restante do aluguel. Veio para cima de mim, estava imobilizada com as pernas erguidas, arreganhadas e seguras por duas pessoas vestidas de túnicas negras.
Meu choro foi mudo, tentei gritar, mas minha voz não saiu. Algo que me deram para beber em uma taça antiga de ferro deveria ser algum tipo de droga paralisante.
De repente surgiu um clarão e o meu grito enfim ecoou da maneira mais forte que já conseguira gritar, ao mesmo tempo em que impulsionei meu corpo tentando pular de cima daquela pedra e correr para longe dali.

Aquela cena tenebrosa desapareceu como fumaça no ar, senti a presença e a respiração de outra pessoa atrás de mim. Assustada eu virei o corpo rápido e dei de cara com o Xavier deitado ao meu lado. Desabei a chorar, ainda estava apavorada, mas logo descobri que tudo não passara de um pesadelo. A mesa de pedra na verdade era a cama do Carlos e a caverna era o quarto. Só então dei-me conta de que estava nua… ele também. O policial abraçou-me forte e carinhosamente, disse para eu parar de chorar, porém eu não conseguia, apertei ainda mais meu corpo contra o dele e disse que estava com medo. O homem gentil e carinhoso prometeu que me protegeria de todo o mal. Ele acariciou o meu rosto enxugando as minhas lágrimas. O nosso primeiro beijo aconteceu mais natural do que deveria, também o momento a seguir, o da penetração e consumação do coito. Não senti culpa como se cometesse um adultério, eu só queria sentir o corpo daquele homem fundido ao meu e transar loucamente para esquecer o pesadelo. Em segundos não havia mais aflição, vivia um sonho bom e acabei-me em um orgasmo múltiplo sentindo meu interior inundado por uma ejaculação similar a um tsunami. Minha última recordação após descer das nuvens, aninhar-me nos braços do Xavier e dormir como um bebê cheio de soninho, foi uma ligeira preocupação com a quantidade de líquidos que escorria entre minhas pernas e as evidências que deixaria sobre a cama do Carlos.
Acordei assustada com o som de batidas na porta do quarto. Meu Deus! É o Carlos, pensei cheia de sentimentos de culpa com a pisada na bola que acabara de cometer. Já era dia, olhei apavorada para o lado procurando em vão o amigo. Estava sozinha na cama. A porta abriu, apenas uma fresta, e ouvi a voz do Xavier:
— Mila! Hora de acordar.
Senti um alívio do tamanho do mundo, mas ainda estava confusa. Respondi que já estava levantando. Ele disse que sairíamos em meia hora e fechou a porta. Levantei pensativa, enrolei-me na toalha e examinei os lençóis e fronhas, as únicas marcas eram de umidade, mas do meu suor. Nada de sêmen ou odores diferentes. Será que tudo não passou de um sonho? Questionei-me. No entanto pareceu-me ter sido tão real o que vivera a minutos.

Depois de uma ducha vesti uma roupa e fiz uma maquiagem básica rapidão, tomei uns goles de café e ganhei uma carona ao mesmo hotel em que eu ficara no momento da minha chegada a Miami. Fiz mais alguns agradecimentos pela ajuda enorme, inconscientemente quase o beijei na boca durante a despedida (desviei a tempo e o beijei no rosto), e ele se foi.
Eu ficaria hospedada por um tempo indeterminado naquele local, ainda ponderava sobre os fatos ocorridos nos últimos dias. Não procuraria uma nova moradia enquanto não decidisse qual caminho seguiria. Faltavam dois meses e meio para vencer o meu Visto de turista, contudo, abrir mão desse tempo de permanência nos EUA e retornar ao Brasil antecipadamente não estava descartado.
Na terça-feira fui trabalhar normalmente no período da tarde. Assim que cheguei recebi um convite do meu patrão para acompanhá-lo até sua saleta. Aquilo era deveras anormal, com certeza alguma treta me aguardava. O cubano sentou por detrás de sua mesa enquanto eu permaneci em pé, tirou uma quantia em dólares da gaveta e sem fazer o menor rodeio disse que eu estava dispensada. Não deu nenhum motivo específico, falou apenas que costuma trocar as garotas com frequência a pedido dos clientes que gostam da rotatividade.
Que desculpa esfarrapada, pensei, nosso grupo era de 18 meninas, e levando em consideração que a maioria esmagadora da clientela era rotativa e os locais contratavam somente um programa por semana, demoraria meses para começarem a enjoar de nós. Eu fui contratada a menos de dois, então não seria esse o motivo. Tentei argumentar dizendo que eu tinha conhecimento de um "ranking" criado pelo Pepe, eram estrelas dadas pelos clientes levando em consideração os detalhes da aparência e desempenho da garota de programa (conhecido no meio como "Test drive de GP"). Ouvi de fontes seguras que eu era 5 estrelas, ou seja, uma das preferidas daquele lugar. O homem falou com descaso que não existia nada daquilo, era só conversa de empregados. Estendeu a mão com o dinheiro em minha direção e disse que era referente aos meus últimos dias de trabalho. Depois foi curto e grosso encerrando a conversa e dizendo para eu ir embora, pois ele tinha trabalho a fazer.
Gente, que coisa estranha, não lembro de ter feito nada de errado. O patrão sempre foi sério, é verdade, mas também era super educado e simpático. Não conhecia essa sua face grosseira. O que será que aconteceu? Tentava entender a razão de tudo isso enquanto me dirigia até a cozinha para despedir-me do pessoal.
Eu até pensei em ligar no dia seguinte e falar com o Pepe, ele só trabalhava de quarta à domingo. O homem era irmão da patroa e poderia interceder por mim. No entanto eu desisti logo da ideia, não gostaria de trabalhar em um ambiente onde o dono não me queria. Também não fiquei me lamentando pela perda do emprego (apesar de adorar aquele trabalho) já que de certa maneira o meu patrão facilitou a minha tomada de decisão: aceitaria a oferta de emprego no navio, daria um sim para o gordinho em nosso encontro do dia seguinte.

Continua…

Nenhum comentário:

Postar um comentário